quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A Rotativa Parou! Os Últimos Dias Da Última Hora de Samuel Wainer

“Uma vitória do progresso”, título do derradeiro artigo de S. W. para a Folha, que versava sobre as conquistas dos operários liderados por Lech Walesa na Polônia.



Livro de Benicio Medeiros, publicado em 2009, A Rotativa Parou!, 215 páginas, Civilização Brasileira, conta os bastidores da redação de um jornal que ficou para a história da imprensa brasileira. E mais, informa nas entrelinhas da narração um pouco da situação política, econômica e social do país na época em que Ultima Hora permaneceu sob o comando de seu criador.


Cheguei a esse livro por curiosidade em saber quais obras estavam concorrendo a prêmios de jornalismo, como o Esso e o Jabuti. Ao pesquisar na internet, li o título citado acima e me interessei mais ainda ao ver a capa. Até então nem imaginava da existência desse jornal. Já tinha lido em vários lugares o nome Samuel Wainer, mas não sabia quem era e o que fazia. Pois bem, resolvi comprar o livro.


A Rotativa Parou! é, nas palavras do autor, um livro de lembranças, com poucas entrevistas e uma certa pesquisa em torno do contexto do jornal. Portanto, é caracterizado como livro-reportagem. Uma curiosidade explanada pelo autor:  inicialmente era para ser um artigo, que cresceu, foi sendo separado por capítulos e acabou se transformando nesta obra.
 
Benicio trabalhou como repórter por um curto período na UH. Durante esse tempo, cobriu “abobrinhas” pelas ruas do Rio de Janeiro. Mas também fez entrevistas com personalidades importantes, como Di Cavalcanti. Em 70, época em que sequestros de diplomatas por grupos contra o regime era uma das formas de protesto, chegou a fazer plantão em frente a embaixada da Alemanha e Suiça junto a varios outros jornalistas. Sem muito êxito, pois as informações oficiais eram escassas nessa época, há seis anos instalada a ditadura.


É interessante a forma como descreve o ambiente da redação do UH. Para nós, estudantes de jornalismo, a realidade de trabalhar em uma redação parece algo distante. Mas ele consegue descrever um pouco do que é, pelo menos em sua época, o espírito de ir atrás das fontes e depois sentar para escrever.


Benicio era um repórter jovem que via ao seu lado grandes nomes do jornalismo, como Moacir Werneck de Castro, Nelson Rodrigues e João Ribeiro. O autor conta como era trabalhar com Samuel Wainer. “Talvez a maior diferença entre UH e os concorrentes é que esses não contavam com o carisma, o dinamismo e a ousadia de Samuel Wainer. Isso não podia deixar de se refletir no seu jornal e contribuir para o extraordinário sucesso da UH nos primeiros tempos.” Realidade bem diferente dos veículos comandados por empresários que só vêem o jornal como barganha. Medeiros e muitos outros que trabalharam com Wainer acreditam que esse carinho que o dono tinha para com o jornal se devia as suas raízes e claro, ao seu sonho. Wainer, antes de empresário, foi repórter, inclusive trabalhou para Assis Châteaubriant, em “O Jornal”. Muitos questionaram na época como ele teria levantado fundos para erguer a UH. Um só acontecimento talvez explique.


Samuel, em março de 1949, como repórter do “O Jornal”, foi ao interior do Rio Grande do Sul, numa fazenda em São Borja, achar Getúlio Vargas para realizar uma de suas mais marcantes reportagens. Retornou com a matéria, dando o título “EU VOLTAREI COMO UM LIDER DE MASSAS”. Getúlio voltou, em 1951, dessa vez eleito pela via democrática e então já tratava Samuel como “Profeta”. Muitos consideram, inclusive um texto que li no site arquivo público de São Paulo, que o Ultima Hora foi idealização de Vargas. De fato, indícios apontam tal afirmativa. A UH defendeu o governo getulista durante todo o seu mandato (1951-54). Por conta disso, enfrentou uma série de campanhas que ameaçavam a sua própria existência.


Assuntos polêmicos a parte, a importância do jornal para a imprensa brasileira está relacionada à sua diagramação inovadora; a uma linguagem que se aproximava ao popular, sem apelar ao sensacionalismo; aos intelectuais que passaram pela redação; à sua personalidade forte; tudo isso fruto de um sonho de um jornalista que usou de todos os seus esforços para fazer o seu jornal entrar para história da imprensa brasileira.

 
A UH sobreviveu durante 20 anos, de 1951 a 1971, quando passou de mão em mão até fechar as portas com uma dívida de 450 milhões de cruzeiros em 1991. “A UH que valeu a pena terminara há muito tempo, exatamente no dia em que Samuel Wainer e seu jornal deixaram de compartilhar os seus destinos.”, desabafa Benicio Medeiros, autor dessa obra que lhe valeu o quarto lugar no 52º prêmio Jabuti.

“Em 1971, mesmo ano que vendeu a UH, Samuel tornou-se empregado do antigo concorrente Adolpho Bloch, comandando um semanário de pouca duração, o Domingo Ilustrado (...) Depois dessa curta experiência, como qualquer outro jornalista brasileiro em busca de melhores oportunidades, seguiu para São Paulo, assumindo inicialmente –ironia do destino – o cargo de redator-chefe da última Hora paulista, que ele próprio fundou e que no tempo de exílio vendera ao grupo Folha.”


Samuel morreu em 2 de setembro de 1980, aos 70 anos. Quem quiser saber mais sobre a sua vida, Minha Razão de viver, eds. Augusto Nunes & Pinky Wainer, Planeta, 2005, é uma autobiografia editada postumamente por sua filha, a artista plástica Débora ("Pinky") Wainer.

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